sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Envelhecer: com mel ou fel? Bem .... e você caro(a) amigo(a)... Como vai ser? Com mel ou com fel? Escolha rápido pois começamos o processo assim que nascemos.... e não paramos até ....




Conheço algumas pessoas que estão envelhecendo mal. Desconfortavelmente. Com uma infelicidade crua na alma. Estão ficando velhas, mas não estão ficando sábias. Um rancor cobre-lhes a pele, a escrita e o gesto. São críticos azedos do mundo. Em vez de críticos, aliás, estão ficando cítricos, sem nenhuma doçura nas palavras.
E alguns desses, no entanto, teriam tudo para ser o contrário: aparentemente tiveram sucesso em suas atividades. Maior até do que mereciam. Portanto, a gente pensa: o que querem? Por que essa bílis ao telefone e nos bares? Por que esse resmungo pelos cantos e esse sarcasmo público que se pensa humor?
Isso está errado. Errado, não porque esteja simplesmente errado, mas porque tais pessoas vivem numa infelicidade abstrusa. E, demais, dever-se-ia envelhecer maciamente. Nunca aos solavancos. Nunca aos trancos e barrancos. Nunca como alguém caindo num abismo e se agarrando nos galhos e pedras, olhando em pânico para o buraco enquanto despenca. Jamais, também, como quem está se afogando, se asfixiando ou morrendo numa câmara de gás.
Envelhecer deveria ser como plainar. Como quem não sofre mais (tanto) com os inevitáveis atritos. Assim como a nave que sai do desgaste da atmosfera e vai entrando noutro astral, e vai silente, gastando quase nenhum combustível, flutuando como uma caravela no mar ou uma cápsula no cosmos.
Os elefantes, por exemplo, envelhecem bem. E olha que é uma tarefa enorme. Não se queixam do peso dos anos, nem da ruga do tempo e, quando percebem a hora da morte, caminham pausadamente para um certo e mesmo lugar – o cemitério dos elefantes, e aí morrem, completamente, com a grandeza existencial só aos grandes permitida.
Os vinhos envelhecem melhor ainda. Ficam ali, nos limites de sua garrafa, na espessura de seu sabor, na adega do prazer. E vão envelhecendo e ganhando vida, envelhecendo e sendo amados, e porque velhos, desejados. Os vinhos envelhecem densamente. E dão prazer.
O problema da velhice também se dá com certos instrumentos. Não me refiro aos que enferrujam pelos cantos, mas a um envelhecimento atuante como o da faca. Nela o corte diário dos dias a vai consumindo. E, no entanto, ela continua afiadíssima, encaixando-se nas mãos da cozinheira como nenhuma faca nova.
Vai ver, a natureza deveria ter feito os homens envelhecerem de modo diferente. Como as facas, digamos, por desgaste sim, mas nunca desgastante. Seria a suave solução: a gente devia ir se gastando, se gastando, se gastando até desaparecer sem dor, como quem, caminhando contra o vento, de repente, se evaporasse. E iam perguntar: cadê fulano? E alguém diria – gastou-se, foi vivendo, vivendo e acabou. Acabou, é claro, sem nenhum gemido ou resmungo.
Isto seria muito diferente de ir envelhecendo por um processo de humilhações sucessivas como essa coisa de ir deixando rins, pulmão e intestinos pelas mesas de cirurgias, numa mutiladora dispersão.
Acho que o que atrapalha alguns maus envelhecedores é a desmesurada projeção que fizeram de si mesmos. Dimensionaram-se equivocadamente. Deveria ser proibido, por algum mecanismo biológico, colocarmos metas acima de nossas forças. Seria a única solução para acabar de vez com a fábula da raposa e as uvas. Assim, a raposa não envelheceria resmungando por não ter devorado o que não lhe pertencia. Deveria, portanto, haver um “relais”, que desligasse nossos impulsos toda vez que quiséssemos saltar obstáculos para os quais não temos músculos. Assim, sofreríamos menos e não amargaríamos não ter tido certas pessoas, conquistado certos reinos, escrito certas obras-primas.
A literatura tem lá seus personagens-símbolos a esse respeito: o Fausto e o Dorian Gray. Apavorados com a velhice e a morte, venderam a alma ao diabo e pediram a juventude de volta. Não deu certo. O diabo não joga para perder. Dizem que a única vez que o diabo foi realmente derrotado foi naquela disputa com Deus a respeito de Jó.
Especialistas vão dizer que envelhece mal o indivíduo que não realizou suas pulsões eróticas essenciais: aquele que deixou coagulada ou oculta uma grande parte de seus desejos. Isso é verdade. Parcial, porém. Pois não se sabe por que estranhos caminhos de sublimação há pessoas que, embora rochas de levar tanta pancada na vida, têm, contudo, um arco-íres na alma.
Bilac dizia que nós deveríamos aprender a envelhecer com as velhas árvores. Walt Whitman tem um poema que diz: “Penso que podia ir viver com os animais que são tão plácidos e bastam-se a si mesmos”.
Ainda agora tirei os olhos do papel e olhei a natureza em torno. Nunca vi o sol se queixar no entardecer. Nem a lua chorar quando amanhece.
Affonso Romano de Sant'anna

2 comentários:

  1. achei perfeito o modo de como sao relacionadas os dois sentidos nao devemos evelhecer com rancor ou armaguras
    mais sim com felicidade cincera
    etc

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  2. Lembrar é facil pra quem tem memória,esquecer é dificil pra quem tem coração"Quando fazemos uma escolha, qualquer escolha, estamos dizendo sim para um lado e dizendo não para o outro. Então, algum sofrimento sempre vai haverAmigos novos são bem-vindos, trazem frescor à nossa vida, mas há certos momentos em que precisamos de um espelho humano, alguém em quem possamos nos Cada palavra tua é um sorriso que se esboça em mim… cada elogio e calafrio me cobre em laços de cetim…cada sentimento reciproco e trocado é um tesouro bem guardado…cada pensamento partilhado é como uma noite de céu estrelado…em cada bom dia irradia uma bolinha de sabão colorida…em cada criatura que se perde na noite existe um lago para o seu reflexo…em cada respirar teu há um carinho submersorefletir e avalizar nossa origem e identidade. Estes espelhos geralmente são nossos pais, irmãos e os "velhos amigos", mas pode ser também uma fruta que você colhia no pátio da casa da sua infância, pode ser um fusca que você não tem coragem de vender, pode ser um anel que foi da sua avó e que hoje está no dedo da sua filha. Pode ser qualquer coisa que te leve pra trás e te traga de volta, assegurando quem você é — e sempre foi"Não há amor sem sofrimento - sem o sofrimento da renúncia a si mesmo, da transformação e purificação do eu para a verdadeira liberdade. Onde não houver algo pelo qual valha a pena sofrer, também a própria vida perde o seu valor

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